O divórcio representa uma mudança profunda na vida pessoal e financeira dos ex-cônjuges, e uma das questões mais delicadas após a separação está relacionada com a casa partilhada durante o casamento. Em particular, a forma como a morada fiscal é gerida após o divórcio pode ter um impacto direto na tributação das mais-valias no momento da venda do imóvel.

A legislação portuguesa prevê a possibilidade de isenção de mais-valias em sede de IRS quando se vende uma habitação própria e permanente, desde que o valor obtido seja reinvestido noutro imóvel destinado ao mesmo fim. No entanto, após o divórcio, se um dos ex-cônjuges alterar a morada fiscal antes da venda, pode perder o direito a essa isenção, mesmo que continue a pagar o empréstimo bancário. Esta realidade é frequentemente ignorada, o que pode levar a consequências fiscais inesperadas.

O que diz a lei sobre mais-valias na venda de imóveis?

De acordo com o regime fiscal em vigor, um contribuinte pode beneficiar da isenção de mais-valias na venda da sua habitação própria e permanente se, no prazo de 36 meses, reinvestir o valor da venda (deduzido do montante em dívida ao banco) na aquisição de uma nova habitação com o mesmo fim. Contudo, um dos critérios fundamentais para o reconhecimento dessa isenção é que a morada fiscal do contribuinte coincida com o imóvel vendido durante, pelo menos, os 12 meses anteriores à transação.

Assim, não basta ser proprietário ou estar a pagar o empréstimo do imóvel. É essencial que o imóvel seja, de facto e legalmente, a residência habitual, comprovada pela morada registada nas Finanças.

Divórcio e mudança de morada: onde está o problema?

Após o divórcio, é comum que apenas um dos membros do ex-casal permaneça a viver na casa comum. O outro, muitas vezes, muda-se para uma nova residência e altera a sua morada fiscal. Apesar de ambos poderem continuar a pagar o crédito à habitação ou outras despesas do imóvel, a alteração da morada fiscal tem consequências diretas: o ex-cônjuge que já não reside legalmente no imóvel perde a possibilidade de aceder à isenção de mais-valias.

Ou seja, mesmo que continue a cumprir com as obrigações financeiras associadas ao imóvel, se a morada fiscal não coincidir com a localização da casa vendida nos 12 meses anteriores à venda, a Autoridade Tributária irá considerar que o imóvel deixou de ser habitação própria e permanente. Neste caso, os ganhos obtidos com a venda da quota-parte do imóvel ficam sujeitos a tributação em IRS.

Exemplo prático

Imagine um casal que adquiriu um apartamento durante o casamento. Após o divórcio, a esposa permanece a viver no imóvel com os filhos, enquanto o ex-marido muda de residência e atualiza a sua morada fiscal. Mesmo que ele continue a pagar metade do empréstimo bancário, essa contribuição não será suficiente para garantir a isenção de mais-valias no futuro. Se decidir vender a sua parte do imóvel, a Autoridade Tributária irá aplicar a tributação sobre os ganhos obtidos, já que o imóvel deixou de ser considerado, para efeitos legais, a sua habitação própria e permanente.

Requisitos para manter a isenção de mais-valias após o divórcio

Para preservar o benefício fiscal da isenção de mais-valias, é essencial cumprir os seguintes critérios:
  • Manter a morada fiscal registada na casa até à data da venda;
  • Comprovar que o imóvel foi, efetivamente, a habitação própria e permanente nos 12 meses anteriores à venda;
  • Reinvestir o valor da venda (deduzido do empréstimo bancário) na compra de uma nova habitação própria e permanente, no prazo máximo de 36 meses.

Se algum destes requisitos não for cumprido, a Autoridade Tributária irá tributar as mais-valias, mesmo que a venda tenha sido feita no contexto de uma separação ou divórcio.

O que deve ser considerado em caso de divórcio

Ao planear o divórcio e a partilha de bens, é essencial ponderar as implicações fiscais da alteração da morada. Se existir intenção de vender o imóvel partilhado a curto ou médio prazo, é recomendável adiar a mudança de morada fiscal até que a transação esteja concluída, ou, pelo menos, até garantir que os requisitos legais para a isenção de mais-valias são cumpridos.

A decisão de mudar a morada fiscal deve ser estratégica e consciente, já que pode ter um impacto financeiro significativo. A perda da isenção de mais-valias pode representar milhares de euros a pagar em IRS, valor que muitas vezes apanha os contribuintes de surpresa.

O cruzamento entre divórcio, alteração de morada fiscal e tributação de mais-valias é um tema de extrema relevância para quem atravessa uma separação. Uma má decisão ou um simples desconhecimento da lei pode resultar em perdas fiscais consideráveis. Por isso, é essencial estar informado e, sempre que necessário, procurar aconselhamento fiscal antes de tomar qualquer decisão definitiva sobre a casa comum.

FONTE: CASASAPO